O recente terremoto na Itália coincidiu com o Dia Mundial da Saúde, tornando mais expressivo o mote comemorativo escolhido pela Organização Mundial da Saúde para a data: a necessidade de que hospitais e unidades de saúde sejam concebidos e preparados para manterem-se seguros e funcionando em situações de emergência, sejam estas causadas por catástrofes naturais, por situações de conflito armado, ou por acidentes ecológicos e epidemias. Segundo a OMS, apenas os desastres naturais afetaram 211 milhões de pessoas em 2008, vindo a causar a morte de mais de 235 mil indivíduos.

Uma emergência implica naturalmente em um acréscimo de demanda sobre hospitais e postos de saúde, quando estes muitas vezes estão fisicamente danificados, em conseqüência direta do evento e de suas circunstâncias. Ao contrário do que se pode imaginar, muitas das mortes ocorrem não imediatamente ao desastre, mas nos dias subsequentes, em função de falhas no abastecimento de água, energia e alimentos, e pela deficiência ou ausência de cuidados médicos. Na verdade, o colapso funcional após uma catástrofe muitas vezes é maior que o dano físico por ela imposto, e suas conseqüências para a população podem ser também de magnitude comparável àquela, devida ao evento, propriamente.

Em 1985, a erupção do vulcão Nevado del Ruiz, na Colômbia, matou cerca de 25 mil pessoas; o maremoto de 2004 no Oceano Índico deixou 230 mil mortos em onze países. Pode-se imaginar a desorganização causada aos serviços médicos pelo súbito e enorme acúmulo de pacientes, muitos deles em estado crítico. Mais difícil é aquilatar-se o grau de desmantelamento da rede de saúde: no terremoto ocorrido na cidade peruana de Pisco, em 2007, 95% dos leitos hospitalares da cidade foram perdidos em minutos. E, em outro contexto: nas três semanas que durou o último conflito na Faixa de Gaza, 25 profissionais de saúde foram feridos, e outros 16 morreram – em serviço. Além disto, 15 hospitais, 41 postos de saúde e 29 ambulâncias sofreram danos de monta.

Mas, o Brasil é abençoado por Deus, bonito por natureza, e catástrofes naturais e situações de conflito e violência não ocorrem aqui. Ou ocorrem? As enchentes do último verão afetaram mais de 1,5 milhões de pessoas em Santa Catarina, com 80 mil desabrigados e 114 mortos. No Estado do Rio, o hospital São José do Avaí, referência em Itaperuna, no noroeste do estado e em áreas de Minas Gerais e Espírito Santo foi invadido pelas águas do rio Muriaé, e os três hospitais de Pádua foram temporariamente fechados, obrigando à transferência de seus pacientes para unidades em outros municípios.
 Um hospital seguro é aquele que, em uma situação de emergência, tem seus serviços assistenciais plenamente acessíveis e atuando em sua capacidade máxima, dentro de sua estrutura física original. Portanto, é aquele que goza do maior nível de proteção possível em face de um desastre (natural ou não), e cujas rotas e vias de acesso permanecem livres e desimpedidas, com seus serviços críticos (água, alimentação, energia, comunicações, medicamentos, serviços de diagnóstico e outros) em pleno funcionamento, garantindo não apenas a continuidade dos serviços anteriormente exigidos, mas a absorção adequada da demanda acrescida pela emergência.

A ausência de erupções, terremotos e maremotos não podem nos induzir a uma falsa sensação de segurança, como os exemplos do último verão, acima, nos mostram. Além disto, as lições do verão de 2007-2008 não podem ser esquecidas: todos se lembram da desorganização dos serviços durante a epidemia de dengue hemorrágico, e da enorme e injustificada demora na resposta das autoridades de saúde, quer no reconhecimento da emergência, quer no reforço então exigido pela rede assistencial. Sem medo de errar, pode-se afirmar que poucas unidades de saúde no Brasil – públicas ou privadas – se encontram dentro do conceito moderno de hospital seguro.

E cabe perguntar: as UPA estão sendo edificadas dentro desses princípios, propostos pela OMS e pela Organização Panamericana da Saúde?

Celso Ferreira Ramos Filho
Diretor de Previdência e Assistência SMCRJ